sábado, 14 de novembro de 2015

As Crianças

E uma mulher
que trazia um menino ao colo
disse:

- Fala-nos das Crianças.

E ele respondeu:

- Os vossos filhos
não são vossos filhos:
são filhos e filhas
do chamamento da própria Vida.

Vêm por vosso meio
mas não de vós;
e apesar de estarem convosco,
não vos pertencem.

Podeis dar-lhes o vosso amor;
mas não os vossos pensamentos:
porque eIes têm pensamentos próprios.

Podeis acolher os seus corpos;
mas não as suas aImas:
porque as suas aImas
habitam a casa de amanhã
que não podeis visitar,
nem sequer em sonhos.

Podeis esforçar-vos por ser como eles;
mas não tenteis fazê-los como vós.

Porque a vida não vai para trás,
nem se detêm com o ontem.

Sois os arcos, e os vossos filhos
as setas vivas projectadas.

O Arqueiro vê o alvo no caminho do infinito,
e reteza-vos com o seu poder
para que as setas
possam voar depressa para longe.

Que a vossa tensão na mão do Arqueiro
seja de alegria.

Porque assim como Ele gosta
da seta que voa,
também gosta do arco que fica.


                                             (Khalil Gibran, in 'O Profeta')

segunda-feira, 9 de novembro de 2015

"A birra apanhou-me!"

Esta é a "nossa" estória! Partilho-a agora com vocês.
Começou há seguramente 3 anos e meio. Começa com um urso a que demos o nome de "Urso Mau" (não sei explicar a escolha do nome, pois o Urso Mau é um fixe!).

A Popotinha é uma criança igual a qualquer outra: exige mimo, montanhas de atenção, autonomia, quer brincar tanto como dormir, frusta-se tal como ri e sorri, grita e fala alto, quer abraços e quer que a entendam. Tem birras como eu e tu! 
Mas, às vezes, as birras ficam com ela, ela não lhes consegue fugir. Nessas alturas, pergunto-lhe: "_ A birra apanhou-te!", com carinho, empatia... Ela confirma! Então montamos a caça à birra! Tiro-a do sítio onde está, vamos para ao pé de uma janela ou porta, e tiro-lhe a birra. Ás vezes está nas costas, outras atrás das orelhas e é retida nas minhas mãos em concha e atirada pela janela/porta ou vai para o bolso quando não tenho alternativa. Para ela não voltar, o Urso Mau apanha-a e fica com ela. 
Já aconteceu ir de férias e as birras eram muitas. A Popotinha confidenciou-me que o Urso Mau tinha ido de férias também. Pedimos reforços: chamamos o seu primo - o Urso da Natura!

A Popotinha agradece sempre ao Urso da Natura quando o vê!
Já chegámos a ir de férias para bem longe e pedimos antecipadamente para que eles os dois viessem connosco. Mas as birras vinham tanta vez aborrecer a Popotinha que tive de perceber o que se passava. A Popotinha disse-me que eles aproveitaram o passeio e foram fazer canoagem de manhã e ainda não tinham voltado. Quando eles voltaram, invoquei o contrato das férias. Que falta de profissionalismo!! 
O Urso Mau já chegou a ficar com birras minhas e do pai também. Mas voltaram e a perspicácia da Popotinha informa-me que tinha deixado a janela aberta e a birra era tãaao grande que o Urso Mau não a aguentou sózinho. Ajudou-me a tirá-la de cima de mim e chutamo-la pela janela com força e rapidamente fechamos a janela. Ufa!!

Ok! Vamos a explicações de desenvolvimento infantil.
O lobo frontal começa a desenvolver-se mais, com grandes ligações neuronais, após um ano de idade. Deve-se à necessidade do bebé de aprender as percepções sociais e emocionais do mundo evolvente. Começa a perceber o que é certo e o que é errado, normas de conduta da sociedade (nesta fase, meramente relacional-dual), o que é esperado ou não dele. Então começa a perceber melhor como relacionar-se com o mundo, começa a perceber como pedir, chamar a atenção, e a lidar com frustrações, necessidades de outros níveis para além do dormir, comer e querer o corpo da mãe/pai. Um fabuloso mundo de ligações começa em força! Lindo! "Os terriveis 2" estão aí! Há especialista que referem que não existe esta fase, considerando que o desenvolvimento neuronal não termina, então não existe fase. Existe aprendizagem e formas de lidar com as nossas próprias emoções, alternativas, aceitações...
Até sensivelmente aos 7 anos, o pensamento mágico domina o mundo da criança!
Perceber isto, quer dizer que podemos utilizar as técnicas de externalização de todas as emoções que a criança ainda não sabe o que é, quanto mais nomeá-las! Lembrem-se que as birras dizem respeito a uma necessidade não colmatada, de segurança, de fome, de sono, de necessidade de conexão! (mais informação aqui e aqui

Outro exemplo prático, pode ser em relação ao monstro que teima em estar no quarto. Podemos ajudar a procurar e podemos estimular a empatia da criança e a sua curiosidade nata para lhe perguntar: "_ Sério? Será que ele quer jogar às escondidas? O que será que ele quer? Será que tem sede? Podíamos-lhe deixar um copo de água! Será que ele se quer aquecer? O teu quarto até é quentinho."

Percebem a ideia?

E a vossa estória, qual é? :)